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quarta-feira, 25 de julho de 2012

Inimputabilidade por Doença Mental [Parte 2]

    Anteriormente, na parte 1 do texto (AQUI), falávamos do conceito de INIMPUTABILIDADE e COMPORTAMENTOS ENCOBERTOS (ou privados). As definições destes conceitos foram centradas em uma única postagem para que, a partir de agora, observássemos somente o fenômeno em si. Não necessitando de mais conceituações.

    Vamos direto ao assunto.

Hey Oh! Let's Go...
 

    No exemplo do final da parte 1, Marcus trás algumas especificidades em formato de questões que serão colocadas aqui e que serão úteis para considerarmos como argumentação. Vejamos:

1º: O que os 3 casos tem em comum?
    Notem que todos os casos referem-se a um único evento: Casa dos pais de Marcus em chamas. O fenômeno nos três casos é unânime: Os pais de Marcus foram mortos e há um incêndio na cena do crime. 

2º: Qual a diferença nos 3 casos?
    Existem certas diferenças TOPOGRÁFICAS (nos referimos a modelos topográficos enquanto ESTRUTURA de algo. Como, por exemplo, a ANATOMIA de um organismo) nos três casos. O fenômeno acontece por falhas técnicas (caso 2), por assassinato seguido de "queima de provas" (caso 3) e assassinato por asfixia ao queimar a casa (caso 1). Todos estes casos são VISIVELMENTE diferentes e não seria difícil para a maioria de nós classificar os atos como "impensados", acidentais ou voluntários. Faça você mesmo: Leia os três casos novamente e classifique-os com estas definições. Acredito que, grande maioria não terá dificuldade de fazê-lo.

3º: Se eu classifiquei o caso 1 como voluntário, o caso 2 como acidental e caso 3 por impensado, estaria fazendo um julgamento do fenômeno coerentemente? Como poderia alguém errar algo tão óbvio?
    Provavelmente seu julgamento parte de um CONDICIONAMENTO "CULTURAL", na qual somos fortemente instruídos em nossa sociedade a emitir tais julgamentos. Essa classificação utilizada foi, possivelmente, baseada em uma TOPOGRAFIA do comportamento. O problema de tal "julgamento" é a omissão do fator mais sublime de quaisquer fenômenos: A FUNCIONALIDADE DO FENÔMENO (no nosso caso, a funcionalidade do comportamento).

Clique na imagem para ampliá-la.


    Neste esquema simplório que fiz, vejam que os comportamentos em sua ordem TOPOGRÁFICA são facilmente visualizados. Podemos facilmente classificar o REPERTÓRIO COMPORTAMENTAL de "Andar", "conversar" e "Chorar". Entretanto, classificação de mesmo nível não é possível com a FUNCIONALIDADE do comportamento. A razão, a contingência,  (os chamados MOTIVOS, INTENÇÕES. Funcionalidade é como se fosse a FISIOLOGIA de um organismo) que levou o organismo a EMITIR tal comportamento não são passiveis de observação direta. Informo que "não são passíveis de observação direta" é DIFERENTE de "não são passíveis de observação". Certo?

    Ok, Walison. Mas, qual a FUNCIONALIDADE de tantas informações que você está "botando" neste texto? 
 

    Boa pergunta, Sr. Zé. Espero que as informações tenham ficado claras, porque agora CONCLUO minha postagem com o motivo desse bombardeio de informações para levantar, de fato, minha nota de chamada.

... Finalizando.

     

    Não temos acesso aos laudos/Relatórios referentes ao caso. Isso faz com que a única coisa que possamos falar sobre o fenômeno ou fenômenos semelhantes é no campo hipotético. Entretanto, isso não é de todo ruim, já que modelos hipotéticos são o primeiro passo para formulações teóricas consistentes.

    Suponhamos que o sujeito na qual estamos nos referindo REALMENTE tenha um quadro nosológico que o classifique como inimputável...
    Nesta caso, o sujeito é classificado como inimputável por um único motivo: CRIAMOS UMA CLASSIFICAÇÃO PARA UM REPERTÓRIO COMPORTAMENTAL ESPECÍFICO E  PODEMOS DEFINI-LO COMO CATEGÓRICO DENTRO DA NÃO-COMPREENSÃO DO MESMO.

Não entendeu? Continue lendo.

   A definição de doença mental considera uma série de comportamentos socialmente "confusos" (podemos notar isso até mesmo em nosso POBRE referencial bibliográfico sobre Psicopatologia). Se falamos que um sujeito é portador de uma patologia denominada ESQUIZOFRENIA, usando como exemplo midiático pop, tenderemos a considerar que este sujeito apresenta um repertório comportamental "confuso" e incoerente com as contingências nas quais estão inseridas. Consequentemente, qualquer comportamento bizarro que o sujeito apresentar será aceitável por não compreendermos diretamente a base de tal comportamento.
   Se eu, que não sou portador de sofrimento mental (nomenclatura para o "doente mental), apresentar o comportamento de VER na ausência de um ESTÍMULO específico (comportamento de ALUCINAR, portanto, um comportamento bizarro) serei fortemente indagado sobre tal comportamento e, provavelmente, eu mesmo questionarei esse meu comportamento, já que NÃO TEMOS UMA "ENTIDADE" RESPONSÁVEL POR MEU COMPORTAMENTO. Entretanto, se o mesmo comportamento é eliciado (é eliciado por ser um comportamento respondente. Notem: estamos falando de visualizar) em um sujeito considerado esquizofrênico, este comportamento é "aceitável" porque temos uma ENTIDADE FUNCIONAL FICCIONAL QUE CONTROLA O COMPORTAMENTO DE VER NA AUSÊNCIA DE ESTÍMULO, neste caso a patologia.
   
   Falamos que o comportamento do portador de sofrimento mental justifica seus atos porque tendemos a MENTALIZAR comportamentos privados. Consideramos que eventos privados fogem das leis naturais por estarem em um campo intocável e imensurável, a mente. Nos casos de inimputabilidade, quando leio e vejo os discursos do advogado de defesa NOTO CLARAMENTE este discurso mentalista por via deles e pela população em geral. Claro que isso não tem nada a ver com esta classe do direito, estamos falando de uma expansão das bases da Psicologia Tradicional/Mentalista.

   Um sujeito que comete um delito de forma a apresentar um HISTÓRICO COMPORTAMENTAL mais claro (como no caso 1 do exemplo de Marcus, em que ele tem um histórico de "comportamentos socialmente inaceitáveis) é facilmente julgado pela relação funcional de seus comportamentos. Damos a ele uma INTENÇÃO de cometer o ato. Entretanto, nos esquecemos que TODO COMPORTAMENTO POSSUI UMA FUNCIONALIDADE e que ele apresentou tal comportamento diante de HISTÓRICO DE CONDICIONAMENTO.
 (Lembremos que mérito e culpa são intenções pessoais que damos aos organismos ao omitirmos seu histórico comportamental)

   Os comportamentos emitidos pelo Portador de sofrimento mental tem uma funcionalidade que é ignorada no discurso. Considerar esta funcionalidade não está vinculada a aplicar penalidades mais severas a estes sujeitos, mas sim a avaliar qual a MELHOR MEDIDA DE REABILITAÇÃO para os mesmos.

  Vejam bem: Comportamentos públicos e privados acontecem pelas mesmas leis que regem o comportamento. Uma ANÁLISE FUNCIONAL DO COMPORTAMENTO aplicada e OPERACIONALIZADA pode analisar a relação causal dos comportamento emitidos e assim elaborar uma intervenção verdadeiramente efetiva.

"Acho que compreendo seu posicionamento".

    Acredito que a Análise do Comportamento, embasado em sua filosofia científica, o Behaviorismo Radical, pode possibilitar medidas interventivas mais efetivas e mais críticas de fenômenos como este. Entretanto, tal contribuição seria mais efetiva se observarmos o fenômeno como ele realmente o é e deixar interpretações mentalistas.

    Não vou tomar um posicionamento pessoal sobre o caso do cara que matou seu professor. A necessidade de trazer este caso para aqui é somente de "reflexão". No sentido de avaliarmos se as medidas de julgamento que fazemos ou estamos envoltos tem uma base de confiança ou de credibilidade.

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